Cultura Gourmet
Confira a fala de Daniel Barsi, professor das disciplinas de Comunicação e Linguagem I e II da Faculdade Ari de Sá
“Tenho um job pra entregar, e o deadline é hoje. E ainda tenho que organizar o coffee break do evento de amanhã, pois meu staff é reduzido. Mas, assim que conseguir terminar, vou passar naquela loja, que tá com tudo em off”. Essa fala, que, em um primeiro momento pode causar estranheza, tem sido cada vez mais recorrente. E não é só no mundo dos negócios que ela aparece…
Desde que termos como gourmet, conceito e prime passaram a circular entre nós, fazendo com que coisas historicamente simples – como um dindin ou um saquinho com churros – passassem a ser comercializados com preços mais elevados, ou que as próprias empresas começassem a se apresentar ao público com uma nova roupagem – sem mudar nada de significativo em seu funcionamento – a língua portuguesa e os nossos referentes culturais têm sido cada vez mais reféns de modismos. Por que estampar “promoção” ou “liquida total” nas vitrines se sale é muito mais chique? E o ar de Paris que se instala ao atravessar a porta de um coiffeur? O tradicional salão de beleza jamais traria esse toque francês.
A Psicologia explica essa necessidade de distinção social que o ser humano busca, de exclusividade, e isso não é uma novidade. Há muito tempo que produtos e serviços não são vendidos pelo seu valor de uso, mas pelo valor de signo, pelo status e experiência que podem proporcionar aos seus consumidores. Esse fenômeno encontra respaldo na indústria cultural, que historicamente sustenta o imperialismo estadunidense nos processos globalizatórios. O american way of life nos inspira a fruir filmes hollywoodianos e música pop estadunidense e a idolatrar ídolos teens de origem norte-americana. “Novela brasileira?! Não assisto, sei nem que horas passa, mas você já viu aquela série ma-ra-vi-lho-sa que passa no Disney Plus?!”
Isso para não falar dos eventos… Trouxemos a Black Friday para a o Brasil! Pena que os preços realmente tentadores sejam restritos aos mercados norte-americanos, sendo o que se vê por aqui mais uma tentativa de fraude. Será que o próximo passo será celebrarmos o Thanksgiving? Afinal, nos EUA, as famosas promoções acontecem após o Dia de Ação de Graças, uma data importante na terra do Tio Sam.
Cada um deve assistir, ouvir e acompanhar o que quiser, nossa liberdade é um bem precioso. E gosto, além de ser individual, é algo sobre o qual não se deve explicações. Mas fica a reflexão… Onde estão a nossa música, o nosso vocabulário tão maravilhoso (“saudade” só existe em português, você sabia?), os nossos artistas, as nossas festas, a nossa produção audiovisual? Gostemos ou não do estilo musical, não deixa de ser interessante ter uma cantora brasileira, pela primeira vez, no topo do Spotify Global, mesmo que seja cantando em espanhol…
Professor Daniel Barsi